Síndrome Janot

A atualidade brasileira testemunha a tensão provocada pelo setorial processo civilizatório da Nação, quando suas instituições destinadas a promover o bem comum, sujeitas à administração humana, agem, com visões diferentes e livremente, em direção aos seus objetivos, no desempenho de suas funções específicas.

O Poder Judiciário, a quem cabe dizer o direito nos casos concretos e fazer Justiça na solução dos conflitos sociais, está sujeito a injunções conjunturais de que não consegue libertar-se totalmente, o que confessa através de sua configuração em sedes recursais especificamente definidas e organizadas.

O Ministério Público, como fiscal da execução das leis e parte deflagradora de processo penal, participa, junto com a advocacia, das ações judiciais e é indispensável à realização da Justiça. Por vezes, o Ministério Público confronta o Poder Judiciário. Deste confronto, em princípio respeitoso e solene, podem resultar debates fortes, em função das convicções com que são apresentadas e contrapostas as teses fáticas e jurídicas, em razão das postulações em julgamento.

No Supremo Tribunal Federal, guardião e interprete da Constituição Federal, o representante do Ministério Público é o Procurador Geral da República. Inevitáveis, entre Ministros e Procurador Geral da República, são as divergências e, também, conformidades. Numas e noutras, quando públicas e orais, nota-se profissionalismo responsável nas intervenções, respeitosas e corteses, de um e de outros; só raramente a interferência de motivações pessoais, decorrentes de fatores estranhos ao exercício de suas nobres funções, exsurgem.

Por isso, nunca imaginei que, entre o Procurador Geral da República Rodrigo Janot e o Ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes houvesse uma séria animosidade pessoal originária de “insinuações maldosas”, por parte do Ministro, sobre a atuação da advogada, filha de Janot, contratada por empresa envolvida com o CADE, embora a mulher do Ministro, também advogada, trabalhe em escritório de advocacia com clientes empresariais alcançados pela operação Lava-Jato.

Agora, através de uma revelação de Janot, soube-se que ele esteve para matar Gilmar Mendes e, em seguida, suicidar-se em plena Sessão do Supremo Tribunal Federal. Arrependeu-se e calou-se por longo tempo a respeito de seu repudiável propósito, quando deveria tê-lo feito para sempre, para evitar o que, estarrecidos e contristados, estamos, agora, vendo acontecer. Janot planejou um crime que não praticou e que, portanto, não existiu. Não é crime a trama, que não sai das mentes para invadir a realidade e que não se concretiza. Não se criminaliza o pensamento. Crime é fato descrito em lei como tal e não há na lei pensamento tipificado como crime. No caso, ao invés de condenar-se Janot por ter pensado em matar Mendes, é de elogiar-se o seu arrependimento e o consequente fato de não tê-lo matado.

Contudo, a revelação de Janot merece repreensão por ser dispensável e pela possibilidade de despertar a ira dos condenados pela opinião pública, entre os quais se encontra o Ministro Gilmar Mendes. Ora, feita e publicada a revelação, a pedido de Gilmar Mendes, o Supremo Tribunal Federal, na pessoa do Ministro Alexandre de Morais (não entender morais como plural de moral), desencadeou uma indecente e desproporcional guerra contra o ex- Procurador Geral da República, sem fundamento legal e degradante.

Essa operação criminosa do Supremo Tribunal Federal, em favor de um Ministro execrado pelo povo, não sem razão, ao invés de punir Janot, pelo seu pensamento revelado e irrealizado, coloca no lixo da história um Tribunal posto a serviço da corrupção, do autoritarismo e do arbítrio. Janot pode não ter sido brilhante no exercício de suas atribuições, como Procurador Geral da República, mas é respeitado pela sociedade por havê-las exercido com correção e dignidade a serviço da Pátria e da Justiça. Não é admirado e nem respeitado pelos que acusou e foram condenados pela Lava-Jato… É de entender-se. Já, Gilmar Mendes e alguns outros Ministros do Supremo Tribunal Federal não fazem por merecer e não merecem o respeito do povo brasileiro, ao marcharem cadenciados para a destruição da Lava-jato, em conúbio espúrio e tácito com um Congresso que legisla para assegurar a impunidade dos assaltantes do erário.

E quando o árbitro da suprema lei decai do respeito dos que devem cumpri-la, é melhor que o árbitro seja substituído do que o povo ficar sem lei e a sociedade sem segurança no caminho para o seu almejado destino. Urgem, pois, medidas para sanear o Supremo Tribunal Federal, sob pena de o Brasil sucumbir diante do arbítrio, da opressão, da incompetência e da falta de escrúpulos de sua suprema corte de justiça. Se prevalecer a vingança de Mendes, por intermédio do neófito Morais, em nome do Supremo Tribunal Federal, contra um ex-Procurador Geral da República, em razão de um mau pensamento tardiamente revelado, é porque já vivemos sob a mais temida e execranda das ditaduras, que vem donde não se espera: do Poder Judiciário.

O outro Rodrigo

Nascido no Chile, de pais brasileiros, Rodrigo Maia, atual Presidente da Câmara dos Deputados, matriculado no colégio eleitoral do Rio de Janeiro, o mesmo de Bolsonaro, ao falar em recente reunião, indagou:

  • Acham os senhores, que investidores estrangeiros aplicarão no Brasil seus capitais ao saberem que um Procurador Geral da República quis matar um Ministro do Supremo Tribunal Federal, em plena Sessão Plenária?
    Risos gerais…
    Querem mais?

Até hoje, Rodrigo Maia deve explicações ao povo brasileiro a respeito das denúncias de recebimento de propina e de acobertamento de seu sogro, Moreira Franco e de seu pai, Cesar Maia, que, contra ele, foram feitas.

A decisão fatal

De uns tempos para cá, observa-se claramente, por parte dos poderes legislativo e judiciário, a intenção de soterrar a Operação Lava-Jato e apagar seus efeitos.
Pouco vale dizer que numa e noutra das instituições nomeadas há ministros e parlamentares honestos, se tais não prevalecem sobre os que não o são e estes nos impingem as suas decisões.

Ao julgar um pedido de Habeas-Corpus, o Supremo Tribunal Federal acaba de fazer a distinção, em processo criminal, entre réus delatores e delatados, para firmar jurisprudência segundo a qual os réus delatados, por co-réus, sempre devem falar por último, em nome do direito à “ampla defesa”, sob pena de nulidade processual. Essa decisão pode fulminar sentenças proferidas na Operação Lava-Jato, como bem demonstrou o Ministro Barroso e, assim, assegurar a impunidade para os assaltantes do erário.

 

Por Henrique Córdova

2 COMENTÁRIOS

  1. A atitude do ex-Procurador da República, apenas demonstra que um representante do Ministério Público, neste caso o maior, imagine o menor, pode ser tão corrupto, desonesto ou maluco, quanto qualquer pessoa. Que pode praticar abuso de autoridade a revelia. Que pode cometer crimes de prevaricação, adulteração de depoimentos em investigação própria, durar uma investigação por inúmeros anos apenas para prejudicar as pessoas que lhe são desafetas, e por aí vai.
    O Ministério Público, que seria maior que os canceres deste país, se tornou maior, que todos os canceres.

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